Pensar fora da caixa? Ok! Mas… você já tem a caixa?
Em sua primeira coluna no blog da PYXYS, nossa head de Operações Vanessa Cabral provoca: é possível inovar no digital sem desenvolver produtos que performam?
Trabalhava num desses ambientes de startup decorados como uma escola de educação infantil na Islândia, com mobiliário cor de madeira clara, estilo nórdico de formas minimalistas. As salas tinham paredes de vidros, que também serviam de board para anotações com canetas pilot multicolores, e corriam de um lado a outro, transformando a arquitetura de acordo com a demanda das reuniões. Visualizou? Conhece um lugar assim? Ah, você também vem da área de criação e seu trabalho pré-pandemia era num lugar assim? E a meta principal das squads parecia ser quem conseguia marcar mais reuniões inúteis por dia? E, nessas reuniões, quer dizer, nesses brainstorms, quanto mais termos made in Palo Alto alguém conseguisse juntar numa frase mais subiria no ranking dos trends?
Pegou a visão? Então, bora adiante: na enésima reunião da semana, o “facilitador” – a pessoa que conduzia a dinâmica – repetia com gosto, boca cheia e brilho no olho, “precisamos pensar fora da caixa”, “vamos pensar fora da caixa?”, “que tal pensar fora da caixa?”. Porém, combinava o jargão com ideias obscuras.
Fiquei pensando “que caixa?”, “sobre o que essa pessoa tá falando?”, “só eu não estou entendendo nada?”. Eu olhava em volta e a galera mexia a cabeça em concordância como se tudo que o facilitador estava dizendo fizesse muito sentido. Sabe aquelas conversas abstratas que fazem a gente duvidar da própria capacidade cognitiva? Mas os coleguinhas seguiam balançando a cabeça… O problema devia ser mesmo comigo: “Será que estou velha? Ultrapassada nos conceitos? Que merda é essa que está acontecendo aqui?”
Canvas vai, prototipação vem, e mais alguns “vamos pensar fora da caixa”, resolvi ir ao banheiro e mandei mensagem para um mano mais próximo: “Vc tá entendendo o objetivo dessa reunião?” “Novas métricas fora da caixa?” Recebi um replay imediato do colega: “Faz cara de paisagem e num pergunta nada que acaba mais rápido” + emoji de gargalhada.
Juro que voltei para a reunião focada na missão: cara de paisagem, Van. Não pergunta. Só respira. Mas o facilitador não facilitava nada: “Gente, vocês estão muito calados. Isso aqui é uma troca, só eu dou ideias. Estamos aqui para pensar fora da caixa”. Num sei o que me deu: quando vi, estava de pé. Peguei uma caneta pilot vermelha, desenhei uma caixa no quadro e circulava intensamente o desenho, repetindo num tom de voz mais enfático do que deveria: “Antes de pensar fora da caixa, nós temos que ter a caixa. A CAI-XA! Nós temos a caixa? Não. Não temos caixa nenhuma. Nós nem construímos a caixa e já queremos pensar fora dela?”
O facilitador me olhava como se eu fosse uma louca descabelada, babando. Os colegas eram só olhos arregalados, tensos. O tal consultor era um recém-chegado de um programa de inovação de Stanford, contratado (por uma pequena fortuna) para nos agraciar com modelos de ponta na geração de protótipos de serviços e soluções inteligentes. E eu basicamente surtei com aquele jargão de “pensar fora da caixa”.
Beleza. Daquele dia em dia, o bordão na comunicação passou a ser: “Cadê a caixa? Vamos primeiro construir a caixa?” Ou seja, vamos primeiro entregar o feijão com arroz muito bem feito: uma plataforma bacana, com usabilidade acessível, UX bala, performando? Depois a gente, com coleta e análise de dados, “inventa moda”?
O pessoal não sabe nem entregar o pacote básico e já quer prometer o premium mega blaster. Atenção, senhor cliente! Ouviu a frase “vamos pensar fora da caixa?”, exija primeiro a caixa.
E aí, quer mais?
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